Este artigo explora a relação entre o Conselho de Administração (CA) e a alta gerência. Cabe entender quais são as responsabilidades de cada parte e quais são os conflitos que podem ocorrer… e eles ocorrem com alguma frequência. Em primeiro lugar, é responsabilidade do CA aprovar a estratégia e o orçamento da empresa, verificar se ela está avançando na direção estabelecida e se está ocorrendo uma gestão transparente, ética e dentro da legislação vigente. Aos executivos, compete propor o plano ao CA, prestar conta dos resultados e agir dentro da lei. Tendo essa divisão de papéis e responsabilidades em perspectiva, as perguntas que ficam são: como promover uma boa relação? Quais problemas podem acontecer nela e como evitá-los?
Para organizar e construir uma relação excelente entre as partes, minha primeira recomendação é que o conselho possua uma secretaria. Esta deve assegurar a regularidade das reuniões, que devem acontecer com o quórum adequado, o qual deve ter, antes delas, estudado as informações previamente enviadas de acordo com a pauta da reunião. Além disso, deve redigir uma ata com próximos passos concordados. Apesar da relevância das reuniões de conselho, é surpreendente como muitas vezes, mesmo nas maiores e melhores empresas, as reuniões perdem produtividade e foco por falta de uma secretaria eficiente, a qual recomendo que seja feita por um dos conselheiros previamente nomeado, com o suporte de um profissional da empresa, parcialmente dedicado a esta atribuição. Quando assumi uma vaga no CA do Vita Ortopedia e Fisioterapia, acabei realizando esta função, com o suporte do meu camarada Leandro Lacerda, a princípio consultor e posteriormente gerente financeiro da empresa. As reuniões ganharam potência e continuaram com qualidade mesmo durante a pandemia e todo o processo de M&A, que foi concluído com excelência com o Fleury.
Outra recomendação é o estabelecimento de uma relação excelente entre os integrantes do conselho e da gestão, para além destas reuniões formais. Nelas, o tempo é escasso, e para promover um entrosamento significante entre todos, além de ser possível explorar temas complexos demais para serem esgotados em poucas horas, é interessante que ocorram reuniões informais, temáticas quando necessário, com uma frequência igual ou até superior às outras. Com o tempo, os desafios e estratégias elaboradas pela empresa ficarão cada vez mais consolidados no entendimento de todos, que com isso poderão ser mais assertivos em suas análises e recomendações nas reuniões do CA. No conselho consultivo da Editora Labrador, liderada pelo meu amigo de décadas Daniel Pinsky, além de reuniões formais, este ano realizamos diversas conversas durante almoços de negócios, as quais contribuíram para o progresso dos trabalhos e ampliaram a assertividade das iniciativas desenvolvidas.
Finalmente, não é possível omitir a existência potencial de disputas de poder entre conselheiros e executivos. Muitas vezes, os conselheiros são indicados pelos acionistas, que também indicam os executivos, que por sua vez exercem uma pressão desmedida junto aos CAs para validar suas linhas de atuação. No pior cenário, acovardado e acomodado, o conselho pode deixar de cumprir seu papel e aceitar as estratégias, orçamentos e ações “goela abaixo”, com resultados nefastos para a empresa, como demonstra o escândalo recente que aconteceu com as Lojas Americanas. Cabe a cada conselheiro e em especial ao presidente do CA, assegurar uma mediação dos interesses potencialmente conflitantes, tendo em mente a necessidade absoluta de preservar a independência dele para o ótimo desempenho do seu trabalho.
Espero ter contribuído com essa reflexão para o desenvolvimento de CAs que contribuam para o fortalecimento de uma relação positiva entre os conselhos e a alta gerência. Possuir uma secretaria estruturada, construir uma relação excelente entre o conselho e os executivos e mediar as disputas de poder são as frentes que destaco para os leitores como necessárias para o sucesso desta iniciativa e são as palavras-chave que deixo. Gostaria de receber o feedback de vocês sobre o artigo e conhecer a sua visão sobre o tema. Vamos com garra absurda!
Rodrigo Guimarães Motta
Diretor Instituto J&F (Germinare)
Doutor em Administração